Blog da Editora Dialética

Brasil-Afro. História, historiografia, teoria do conhecimento em história. Escritos forjados na negação. José Jorge Siqueira

1.O que te motivou a escrever especificamente sobre o tema proposto no seu livro?

Basicamente a necessidade de buscar o leitor/leitora, pois como se sabe, o autor somente se realiza no outro/outra. À sua vez, ao buscar compreender melhor os temas tratados ao longo destes 16 escritos se estará fazendo por um sem-número de pessoas cujas indagações se assemelham. 

2. Como você avalia a presença e a influência da história afro-brasileira na historiografia nacional? 

Veja bem, Gabriela, a história é a do Brasil. O que não dá é para retirar dela a especificidade de sua vertente afro (e indígena, caboré). Eu, por exemplo, tenho toda uma formação em história (graduação, especialização, mestrado, doutorado, pós-doutorado) e jamais tive oferecida esta questão com a importância que ela deve ter para a compreensão do país – certamente aí incluído a história da África, uma solene desconhecida dos currículos universitários à época (para ficarmos até aí restritos) – uma aberração, uma alienação de si mesmo. Neste sentido, estamos promovendo uma verdadeira revolução de revisão da historiografia brasileira.

3. Em sua vasta experiência como escritor dentro da temática, como você lida com o desafio de apresentar a história afro-brasileira de forma honesta e respeitosa, sem romantizar ou minimizar a violência e o sofrimento vividos pelos negros ao longo dos séculos? 

Eis uma questão importante. Sejamos claros, não se trata de limitar as análises por se “homogeneizar”, ou “essencializar” a temática em nome de uma narrativa “politicamente útil”; ou ainda por sacrificar a complexidade da construção do conhecimento em História afunilando-se aí a razão.  Ao contrário, no Brasil a questão do negro no sentido o mais amplo, é a questão do próprio brasileiro em formação. Falamos em termos social-demográficos desde a Colônia e o Império, República afora. Por motivos vários o país é caso exemplar em negar isto. – mesmo em termos acadêmico-científico. Por motivos também óbvios é impossível continuar a negar isso. Como nunca, a hora da democracia – ou segunda Abolição, se quiserem – chegou.

4. Como você enxerga a relação entre os escritos que forjaram a negação da história afro-brasileira e a perpetuação do racismo no Brasil? 

Se a pessoa, a sociedade, não compreende não supera. E paga o preço por isso. Todavia tornou-se altamente instigante, promissoriamente rico, este desafio em todas as suas dimensões.  Temos o espectro em nosso tempo de um outro eixo de preocupações, de uma nova ética, mesmo no mundo do trabalho, como nunca – posto que pela primeira vez na história universal dado fenômeno da globalização – lastreados nos valores fundamentais que realmente interessam, incluso aí nova relação face à natureza, aos direitos dela. Todavia, são valores que quanto mais se distribuem mais aumentam. 

O Brasil é o Brasil. Não vejo aqui certos traumas psicossociais tão radicalmente doentios. Meio caminho vai estar andado por aqui do ponto de vista estritamente racial – além do mais quem vai ter quer lidar com o patológico são eles que criaram o problema, o nosso é outro, é a vida. Agora, outra dimensão é a questão vinculada de forma sistêmica ao desenvolvimento do país, seus modelos. O grande problema é que a Questão Negra do país bate de frente com privilégios que não direitos. Exatamente por isso está nela a raiz da liberdade, da solidariedade social (que é econômica, política), onde a busca de bens materiais finitos vêm ao lado da procura dos bens infinitos – os tais que quanto mais se distribuem têm por razão mais aumentarem.  

5. Qual é o principal valor, debate ou ensinamento que você busca expressar por meio de sua obra?

A paixão de compreender a vida e o mundo é a mais decisiva. Por sua vez, sou daqueles que crêem que a humanidade precisa de uma utopia para viver.  Tenho um  compromisso com o legado dos ancestrais que viveram, trabalharam, lutaram por justiça e dignidade.

6. Seu livro está dividido em 3 partes. Como você buscou organizar a sua escrita?

O livro está sustentado em eixos temáticos. Por primeiro, o caráter sistêmico estruturante da questão do negro no Brasil, recorte teórico e empírico sobre quem tenho reflexão desde 1987 – e o livro é a reunião de escritos publicados desde então, em várias cidades brasileiras e universidades. A instigante descoberta de ser a questão negra, justamente por sua singularidade histórica, ponto de observação (e realização) estratégico da cena brasileira – justo na medida de seu emparedamento sócio-cultural desde sempre na historicidade do país, é o segundo eixo. Por fim, tudo isso nos levou à busca da alteridade como pessoas, como sociedades – questões inexcedíveis dado o caráter ex-colonial escravista desta condição, confundindo-se em parte a história de vida deste autor.  Sou historiador por formação, foi indispensável situar o leitor /leitora sobre como penso tal dimensão, por consequências nas escolhas e diretrizes.

7. No geral, o que conta cada parte/capítulo e por que a forma como foi construído o livro se faz relevante para o resultado e a recepção do leitor à obra? 

Não conto antes de sua leitura, caro leitor/leitora. Ali, a liberdade de escolha é a única condição. Se você quiser pode começar mesmo com poesia e alguma prosa inseridas em inesperado apêndice – mas que dizem muito do que penso e sinto. No mais, percebo na leitura dos escritos a realização de uma transfiguração de linguagem, quando o leitor se apropria do texto conforme suas necessidades intelectuais e sensibilidades tornando-se ele mesmo produtor daquilo que lê. Já então o feito não será mais tão somente meu.

8. Em termos de publicação do livro e questões editoriais, como foi sua experiência?

A Dialética Editora está sendo uma grata surpresa, moderna, ágil, dominando a linguagem das plataformas. Viabiliza com competência, plenamente, a possibilidade do trabalho criativo e independente dos autores. Um show de bola. Vou logo avisando que estou muito ocupado escrevendo outro.

Compre o livro aqui.

Quer receber mais conteúdos excelentes como esses de graça?

Inscreva-se para receber nossos conteúdos por email.

Newsletter - Blog
Avenida Brigadeiro Faria Lima, 4.221 - 1º andar, Itaim Bibi, São Paulo - SP, 04538-133 // Telefone: (11) 4118-6308